sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Keanu Reeves narra documentário sobre cinema e tecnologia



Keanu Reeves e Martin Scorsese no documentário ‘Side by Side’
Foto: Reprodução
Keanu Reeves e Martin Scorsese no documentário ‘Side by Side’Reprodução
NOVA YORK — Muitos embates certamente serão provocados pelo novo documentário de Chris Kenneally, “Side by side”, que explora o impacto da tecnologia digital no cinema do século XXI, mas um fato está além dos argumentos. Para um cinéfilo, esse filme é o paraíso, um simpósio dos sonhos onde diretores, fotógrafos, editores e alguns atores se reúnem para opinar sobre os detalhes de sua profissão. Vale um ano de escola de cinema ou pelo menos mil horas de extras de DVD.
Guiados por um afável e bem-informado Keanu Reeves, os espectadores passam por sets de fimagem e salas de edição, veem clipes esotéricos e familiares, são convidados a examinar muitos equipamentos interessantes. Autores e fetishistas da tecnologia saem igualmente arrebatados. Você não apenas se senta aos pés de Martin Scorsese, Steven Soderbergh, Christopher Nolan e outros heróis do cinema moderno. Também confere as mais recentes câmeras de alta-definição da Panavision, Arriflex, Canon e Red.
Os aspectos geek de “Side by side” são parte do argumento do filme, que não é apenas um exercício de propaganda pró-digital. Céticos são ouvidos tanto quanto os entusiastas e as virtudes do antigo celulóide são amplamente elogiadas. Mas como é o caso em relação a tecnologias digitais de todo tipo — os tablets, o mp3 e a própria internet — o discurso tende para o triunfalismo.
O que já foi experimentado e é considerado a verdade tem sempre problema em competir com o novo, que nesse caso oferece conveniência e portabilidade, além de uma aura cult instantânea. Há algo inerentemente atraente em fazer parte do progresso e muitos dos entrevistados por Reeves colocam sua preferência por pixels e computação gráfica como uma questão de princípios. Eles se veem como vanguarda, avançando com as inovações tanto estéticas quanto tecnológicas, se essa distinção ainda faz algum sentido.
E talvez nunca tenha feito sentido no caso dos filmes, cuja história é medida em saltos de descobertas e invenções. Desde os primeiros dias, os mais importantes diretores conduziram uma espécie de programa de pesquisa e desenvolvimento para o meio, experimentando com edição paralela e montagem tanto quanto gêneros, pensando sobre luz e foco, assim como atuação. Eles também precisaram se adaptar para manter a carreira, uma vez que as grandes mudanças — a chegada do som, da cor, da tela wide screen, da televisão — eram rápidas e frequentes.
Considerado esse histórico, faz sentido que a mais recente e maior mudança tenha sido abraçada não apenas por futuristas como James Cameron e Lana e Andy Wachowski, mas também por diretores como Scorsese e Soderbergh, que entraram na onda em reverência ao passado do cinema. “A invenção de Hugo Cabret”, de Scorsese, — uma extravagância em 3D sobre George Méliès, o mágico e pioneiro dos efeitos visuais no início do século XX — é uma perfeita expressão da ideia de que aceitar o novo faz parte da essência do cinema desde o princípio.
Reeves e Kenneally claramente seguem essa ideia. A presença de Reeves (produtor de “Side by side” e também narrador e mestre de cerimônias) é uma declaração de apoio. Afinal de contas, ele é o Neo, o personagem cuja viagem entre as dimensões física e virtual em “Matrix” pode ser vista como profética, pelo menos no que diz respeito aos filmes.
Nós, espectadores de carne e osso, nos vemos presos entre dois mundos. O filme físico ainda está por aí, com seus defensores. O mais apaixonado e conhecido deles é Christopher Nolan, da série “Cavaleiro das trevas”. Ele e outros são céticos quanto a utopia digital e se preocupam com o risco da sabedoria acumulada e antigos rituais da profissão se perderem.
“Side by side” traz debates fascinantes sobre aspectos dos filmes que são misteriosos, até invisíveis para a maioria dos fãs. Alguns cineastas ficam satisfeitos por poder ver no mesmo instantaneamente as imagens filmadas num dia, quando antes elas precisavam ser enviadas para o laboratório, onde seriam processadas durante a noite. Outros, entre eles alguns fotógrafos, temem que a versão instantânea prejudique a precisão em nome da conveniência. Argumentos similares são usados em relação a edição.
Reeves, que pasosu boa parte de sua vida adulta em sets de filmagem, se sente confortável na companhia de especialista e, como todo ator deve ser, é um bom ouvinte. Apesar de não ser uma consideração completa sobre o estado atual da indústria, “Side by side” é importante para qualquer um que se preocupe com o seu futuro. Kenneally poderia ter dado mais atenção ao mundo além de Hollywood, avaliando o impacto da tecnologia digital em filmes de baixo orçamento, independente ou restaurações, mas dentro do parâmetros definidos, o documentário faz um excelente trabalho.
O filme estreou no dia 19 de agosto nos EUA e ainda não tem data para chegar ao Brasil.

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